Esse é o equipamento do teste. Vamos ver como ele se comporta |
“A aerografia é uma arte em extinção”. É isso que eu ouvi de um colega modelista e ilustrador. E de fato, ele não está mentindo. A aerografia no mundo artístico como um todo está sendo deixado de lado cada vez mais em nome das artes “digitais”. Mas essa máxima não se aplica ao plastimodelismo. Não existe uma ferramenta “digital” que substitua nosso aerógrafo, e com o crescimento do número de praticantes de plastimodelismo no Brasil e no mundo, a demanda por aerógrafos no nosso hobby está cade vez maior.
Hoje em dia, aerógrafo não é mais sinônimo de ferramenta cara como era a questão de uma década atras. Bom... os aerógrafos caros ainda estão por aí... mas como muitas coisas no mundo, à alguns anos os chineses entraram na parada para inflar o mercado com aerógrafos a bons preços e em enorme quantidade, popularizando a ferramenta, possibilitando mais e mais artistas a experimentar a aerografia.
Mas e quanto a qualidade? E a eficiência?
Nessa matéria irei fazer um “Test-drive” num desses modelos de aerógrafos vindos da china. Trata-se do Steula BC- 61 de agulha 0,2 mm. A Steula é mais um das marcas que injetaram esses aerógrafos chineses no Brasil, e fazem um ótimo serviço no quesito suporte ao cliente e peças de reposição, quesitos que outros importadores e distribuidores desses aerógrafos falharam no Brasil.
Vamos iniciar com a ficha técnica do aerógrafo, disponível no site www.steula.com.br :
Adequado para pintura de artes em geral, ilustrações, retoque de fotos, artesanatos, modelismo, hobby. Todos os modelos possuem dupla ação (primeiro liberam o ar e depois a tinta).
Dados Técnicos
- modelo : BC 61-02 (bico 0,2 mm)
- Capacidade do reservatório de tinta = 7 cc
- A tinta chega até o bico por gravidade
- Pressão de trabalho = 15 a 50 PSI
- Entrada do ar comprimido para mangueira entre 3,0 e 4,5 mm
- Possui regulagem do fluxo de tinta
Primeiras impressões:
iniciando os testes com tinta tamiya. Bom desempenho em traços médios, mas a tinta grossa afeta o aerógrafo em traços finos. |
O aerógrafo possui então, a arquitetura clássica e a padronização do aerógrafos japoneses. Isso se evidência no tamanho padrão das roscas e das conexões serem equivalentes as normas reguladoras dos aerógrafos japoneses (o Japão é um dos pucos países que normatizaram essas medidas).
analisando a qualidade dos traços com tinta acrílica tamiya |
O copo fixo na parte de cima tem um bom ângulo e um bom posicionamento em relação aos concorrentes. O espaço limita a ação do dedo indicador, principalmente na mão de aerografistas de mão grande. Mas esse não é um problema exclusivo desses aerógrafos, então acusá-lo disso seria injusto. Um pecado desse aerógrafo (um deles) é a tolerância com que é feita a tampa do copo. O fechamento não é preciso, tornado a tampa instável e não hermética, propensa a transbordo de tinta. Atenção redobrada a esse detalhe.
Mais testes nos traços finos. |
Iniciando os testes:
Tendo as primeiras impressões dele, hora de por tinta e testar a maquina. Iniciei o teste usando tintas acrílicas da tamiya diluídas com thinner próprio, uma opção de tinta muito comum para nós brasileiros.
novos testes, agora com tinta duco. Melhora na performance significativa |
O aerógrafo não se comportou muito bem com a tinta tamiya, muito provavelmente pelo fato da tinta acrilica tamiya possuir uma resina e um pigmento um pouco grossos, e o aerógrafo ter uma agulha 0,2mm. Os sprays de traços finos saíram duros e irregulares. Para os sprays médios, o aerógrafo mostrou um comportamento regular e aceitável, e para traços grandes, o aerógrafo se comportou muito bem. Para esse opção de tinta acrílica, o aerógrafo se mostrou uma boa escolha para pinturas maiores, visando brilho, ou camuflagens simples. Nos traços mais finos, ideais para figuras ou camuflagens rebuscadas, chipping e efeitos de shadding, a combinação não seria boa. O comando da abertura de agulha se apresentou macio demais, tendendo a abrir em excesso e perdemos a finura do traço, mas esse problema é contornado com o uso bem aplicado do limitador de agulha na culatra, que se mostrou muito necessário.
Segui com os testes, dessa vez com tinta automotiva DUCO Pr-colors diluídas com thinner automotivo.
Com tinta duco, a qualidade do traço é muito melhor e mais uniforme. Com esse tipo de tinta, o aerógrafo teve um desempenho muito satisfatório |
Segui com o test-drive, botando o aerógrafo para trabalhar em serviços corriqueiros aqui na bancada do blog, como na customização de figuras de forte apache. Foram três dias de trabalhos intensos e diversas trocas de tinta e pausas para limpeza e manutenção eventual.
Uma limpeza básica era feita todas as vezes que havia troca de tinta (sem desmontar nenhuma peça do aerógrafo), a cada 3 ou 4 trocas de tinta, o aerógrafo apresenta um endurecimento do curso da agulha, necessitando sua retira e limpeza dessa, algo absolutamente dentro do esperado.
A falta de precisão no fechamento do copo de tinta foi um problema algumas vezes, causando acidentes na pintura. Atenção redobrada (mais uma vez) com o fechamento e com a quantidade de tinta no copo do aerógrafo. Também foi sentido pouco precisão no ajuste da trava da agulha, com dificuldade as vezes para setar o aerógrafo em traços finos e finíssimos.
Apos um dia de uso intenso, o aerógrafo já começou a apresentar um dos problemas mais graves desses aerógrafos chineses, como já foi citado aqui, que é o endurecimento do o-ring e do atuador do gatilho. Logo ao final do primeiro dia ele já apresentou endurecimento, e na metade do segundo dia, já apresentava travamentos e a necessidade de reidratação e lubrificação.
Comparativo:
Foi colocado o aerógrafo para trabalhar com outros modelos de aerógrafos de marcas famosos para um comparativo de traço. Foi escolhido modelos de aerógrafo de entrada, todos de agulha 0,3mm ou mais (já que os aerógrafos de traço fino que possuia aqui para comparação são modelos muito sofisticados e caros, a comparação não seria justa, então preferi utilizar modelos de entrada das marcas). O Steula BC 61 foi para a briga com Gatti Ag3 (0,3mm), Iwatta Neo CM (0,35mm), Tamiya HG (0,3mm) e Badger Renegade Rage (0,38mm). Todos trabalhando com a mesma tinta e a mesma diluição. O Steula foi muito bem nesse teste. Ele apresentou o menor traço do teste (esperado por ser o aerógrafo de menor agulha), Apesar do Iwata neo empatar no traço mesmo com uma agulha 0,35, e o tamiya apresentar uma linha mais regular e suave. O Steula também apresentou um bom controle de degradê, um traço bastante suave como o do gatti, e uma cobertura um tanto irregular (dentro do esperado para o tamanho da agulha) porem delicada para efeitos highlight ou de baixa cobertura.
Comparando o equipamento a outros, seu desempenho não ficou abaixo do esperado. Se comportou bem perto de grandes marcas. |
Devido uma tolerância maior na hora de fabricá-los e aos materiais mais baratos, tudo visando baixar custos de produção, esses aerógrafos envelhecem mal. Eles se deterioram muito rápido, e as vezes a manutenção passa a ficar mais cara que a compra de um novo. E por herdar a antiga arquitetura dos aerógrafos japoneses, ele apresenta os mesmos problemas que esses aerógrafos apresentam, mas de forma acentuada.
O o-ring da valvula é um deles, como já foi dito aqui nessa matéria. Mas existe outros problemas:
melhor forma de testar o equipamento é colocando ele pra trabalhar. |
Vazamentos de ar: Não é difícil ver esses aerógrafos apresentando falhas na vedação dos dutos internos de ar, principalmente saindo daquela protuberância da parte inferior do aerógrafo. Mais uma herança do design da Iwata. Porem, esse problema no iwata aparecia com uma incidência milhares de vezes menor. Mas já foi o suficiente para marca remover essa protuberância dos modelos mais modernos da marca, deixando apenas nos modelos clássicos.
Desgaste prematuro do conjunto bico agulha: Com poucos meses de uso intenso, bons aerografistas já são capazes de perceber a perda de precisão do equipamento, um desgaste natural que pode demorar até décadas para aparecer em um aerógrafo de mais qualidade.
Considerações finais:
Os aerógrafos chineses vieram para ficar, com defeitos e acertos, eles estão aí, a preços acessíveis, e gerando resultados satisfatórios. Cabe a marcas importadoras como a Steula oferecer ao mercado opções de peças avulsas para manutenção e suporte aos clientes (não é uma crítica direta a Steula, uma marca que inclusive vem se mostrando muito competente nessa área de pós venda). A questão de arquitetura de aerógrafo, eles são bem satisfatórios, bons aerógrafos por nascença, diria que 0 a 10, recebem uma nota 6,5, podem melhorar muito essa nota se melhorarem as vedações do aerógrafo, e alcançando a perfeição se melhorarem a tolerância na usinagem e na qualidade dos materiais escolhidos. Mas acredito que não seja esse o foco do momento. Esses aerógrafos estão aí para serem uma opção de entrada barata e de alguma confiança, abrangendo o máximo de novos adeptos através dos preços baixos, e sem dúvida fazem isso com exatidão. Então veremos ainda muito novatos promissores e bons trabalhos feitos com esses “baratinhos”, e sinceramente, ainda bem que eles existem, pois o movimento de popularização da aerografia que eles fazem é maior que as falhas que eles apresentam. Aerógrafos chineses estão aí para ajudar. Que bom!
vídeo completo sobre as técnicas utilizadas nessa pintura:
trabalho final feito quase que por completo com o aerógrafo BC-61. Em mãos bens treinadas, pode render um excelente trabalho. |